Empresa relata corrupção em área Yanomami a Bolsonaro em 2019
Denúncia diz que houve cobrança de propina, achaque e fraude em licitação
Por Daniela Lima / CNN
Um ofício obtido com exclusividade pela CNN revela que houve denúncia, em 2019, feita pela única empresa de tráfego aéreo então autorizada para operar na terra Yanomami em Roraima relatando cobrança de propina, achaque e fraude em licitação do nomeado pelo governo Bolsonaro para cuidar da reserva Yanomami.
A denúncia foi enviada diretamente ao gabinete do então presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), em agosto daquele ano.
O documento foi recebido por uma servidora da Presidência, que o assinou. Aliados do ex-presidente afirmaram à reportagem que o gabinete era desorganizado, não conseguindo garantir que a denúncia tenha chegado ao ex-chefe de Estado.
A CNN enviou questionamentos à assessoria de Bolsonaro, que afirmou que todas as comunicações e ofícios enviados à Presidência e inerentes a outras pastas eram encaminhados aos respectivos ministérios.
A Voare, única empresa que era autorizada a operar na terra Yanomami, explica que atendia diversas comunidades indígenas através de contratos com a secretaria especial de saúde indígena, vinculada ao Ministério da Saúde.
Para que médicos, enfermeiros e medicamentos chegassem à terra indígena, era necessário que essa secretaria fizesse o contrato.
“Ocorre que, recentemente, o coordenador do Distrito Indígena Yanomami foi nomeado pelo senador Mecias de Jesus, o que nos trouxe grande indignação, pois, de início, o senador pediu propina para nos manter no contrato. Caso contrário, seriamos substituídos”, relata o ofício.
“Nosso contrato havia expirado em janeiro de 2019, estávamos trabalhando por indenização até que o contrato emergencial, em andamento no SESAI Brasília, fosse concretizado, onde a Voare sagrou-se vencedora”, complementam.
A empresa destaca ainda que o coordenador indicado pelo senador teria decidido realizar uma nova cotação de preço, restringindo a participação de empresas, exigindo que os aviões fossem “aeromédicos”, ou seja, que tivessem equipamentos para que atendimentos também pudessem ser feitos no veículo.
Eles teriam ido à justiça denunciando fraude em licitação, restrição de concorrência. A Voare teria sido desclassificada por não possuir o equipamento aeromédico, mesmo apresentando menor valor de serviço.
Ainda revelam que caso semelhante teria acontecido em 2013, também denunciando ocorrido, mas que, naquela vez, as pessoas envolvidas com o suposto esquema de corrupção foram presas.
No ofício de 2019, a companhia ressalta: “Apesar de impetrado denúncias nos diversos órgãos de controle (CGU, MPF, TCU, PF e justiça) e conversado pessoalmente com a Secretaria Nacional Silvia Waipua, não obtivemos nenhum retorno”. Assim, justificam ter tentado contato com o então presidente.
Outro lado
A CNN tenta contato com a Voare, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
A Leandro Resende, da CNN, a assessoria do senador Mecias de Jesus enviou uma nota de Francisco Dias, o então coordenador do distrito Yanomami citado, que alegou que a Voare deixou de prestar serviços porque ele teria constatado diversas irregularidades, tais como aeronaves inadequadas para o serviço aeromédico.
Assim, abriram um processo de dispensa de licitação para contratação emergencial. A nota ressaltou ainda que o transporte de indígenas era feito sem macas, ao lado de balões de oxigênio. Isso estaria detalhado em uma denúncia do ex-coordenador ao Ministério Público Federal.
Dias diz ainda que prestou esclarecimentos necessários ao Ministério Público de Roraima e também entregou toda a comprovação de que os serviços prestados pela Voare eram feitos sem contrato. Por fim, pontua que a Corregedoria do Ministério da Saúde arquivou um processo aberto sobre esse caso.
Também foi enviado a Leandro Resende um vídeo de Mecias de Jesus, que reforça que a empresa não tinha capacidade de prestar o serviço para o qual estava contratada.
Ele rechaça “toda e qualquer denúncia vazia, leviana e descabida, como essa fala de que ele pediu propina”. O senador também trouxe contexto político ao caso, pois, à época, ele havia sido recém-eleito, afirmando que a companhia teria ligação com partidos político adversários.
Mecias de Jesus está à frente da comissão externa do Senado que apura a crise Yanomami em Roraima, tendo, inclusive, sobrevoado a região recentemente e conversado com o ministro da Defesa José Múcio.
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