Formação de professores yanomami no Amazonas entra na terceira etapa
Aulas do Magistério Intercultural Bilíngue Yanomami são conduzidas pela Secoya no rio Marauiá, em parceria com a Seduc-AM
É durante as férias escolares do mês de julho que os yanomami preparam seus professores para fortalecer a educação escolar dentro dos próprios preceitos culturais, mas que seja reconhecido pela sociedade napë (os não indígenas, os brancos). A formação de professores indígenas yanomami no Amazonas entrou na terceira etapa desde o dia 1º e a formação segue durante todo o mês. O Magistério Intercultural Bilíngue Yanomami-2024 acontece no centro de formação do xapono (aldeia) Bicho Açú, localizado no rio Marauiá, em Santa Isabel do Rio Negro (a 630 quilômetros de Manaus, em linha reta), conduzido pela Associação Serviço e Cooperação com o Povo Yanomami (Secoya).
Participam da atividade 36 alunos e 7 ouvintes, incluindo lideranças, famílias do xapono e organizações convidadas. No total, 26 aldeias dos rios Marauiá (Santa Isabel), Demeni e Ayaris (Barcelos) integram o processo de formação, que é feito em parceria com a Secretaria de Estado de Educação (Seduc-AM), responsável pela cessão dos professores e pela validação do diploma. Esta etapa de formação é a que antecede e permite que os yanomami ingressem no curso de formação superior de professores.
Nesta etapa, 11 professores entre indígenas e não indígenas estão envolvidos. O cronograma de atividades prevê um total de nove disciplinas que estão inseridas dentro de quatro macro áreas do conhecimento: língua yanomami, língua portuguesa, artes e expressão cultura (Linguagens, códigos e suas tecnologias); diretrizes e fundamentos para escolas indígenas, alfabetização e letramento, pesquisa e prática pedagógica na escola indígena (Fundamentos para o Mgistério); governança, cidadania e direitos indígenas e história, geografia e historiografia yanomami (Ciências Humanas e suas tecnologias); matemática e conhecimentos tradicionais (Ciências da Natureza, Matemática e xxx).
Todos os conteúdos são abordado de maneira interdisciplinar, intercultural e bilíngue e contam com o auxílio de tradutores. Para a formação em linguagens, os professores Caio Yanomami, do xapono do Curuá, e Otavio Ironasiteri Yanomami, liderança da Associação Kurikama, auxiliaram o processo.
As disciplinas foram desenvolvidas de forma interdisciplinar. Na abertura, promoveu-se o debate “Educação indígena x Educação escolar indígena”, com a leitura coletiva dos documentos norteadores da escola indígena.
Foram feitas ainda a introdução aos níveis de alfabetização, às diferentes linguagens da infância, a organização do tempo didático, elementos do plano de aula, estudo de métodos e técnicas de alfabetização.
Houve uma atividade prática de aplicação dos conteúdos iniciais através de músicas e brincadeiras tradicionais (pula corda, mímicas, cantos e adivinhações de nomes de animais), permitindo que os alunos demonstrassem a assimilação dos conteúdos das disciplinas. Utilizaram recursos naturais e contextos da realidade Yanomami, como cantos de chegada, nomes de animais e cipó.
Histórico
Há mais de 30 anos a Associação Serviço e Cooperação com o Povo Yanomami (Secoya) vêm construindo e desenvolvendo junto ao Povo Yanomami no estado do Amazonas, nos municípios de Santa Isabel do Rio Negro e de Barcelos, médio rio Negro, um trabalho indigenista voltado para gestão territorial e ambiental autônoma do Povo Yanomami. Isto vem se dando através da promoção dos direitos indígenas, a valorização da cultura tradicional e o desenvolvimento de programas de formação e capacitação de agentes multiplicadores interculturais Yanomami.
Uma das frentes de trabalho é o desenvolvimento de atividades educacionais numa perspectiva bilíngue, diferenciada, específica e intercultural. A formação de professores e o acompanhamento das escolas diferenciadas são parte integrante dessa dinâmica educacional e pedagógica. Esse trabalho desenvolvido em parceria com os Yanomami tem como base a interculturalidade, reconhecendo-se que o contato com o napë trouxe muitos elementos oriundos da sociedade brasileira e interferências ao mundo Yanomami.
A Proposta para o Magistério Yanomami tem como objetivo desenvolver o programa de Formação para Professores Yanomami das Regiões dos rios Marauiá, rio Preto e Ayaris, município de Santa Isabel do Rio Negro e rio Demini, município de Barcelos, no estado do Amazonas, para o Magistério Indígena Yanomami.
Para participar da formação, foi aberto um processo seletivo em todos os xaponos das calhas de rio abordadas. Integram esta etapa, alunos dos seguintes xapono: Bicho Açu, Irapajé, Apuí, Ixima, Pukima Beira, Raita, Raita Centro, Tomoropiwei, Pukima Cachoeira, Manakapiwei, Kona Cachoeira, Kona Centro, Tarakua, Balaio, Komixiwë, Kuruá e Tabuleiro, no rio Marauiá; Lajinha, no rio Preto; Ajuricaba, Katanapiwei, Hemaripiwei, Komixipiwei, Xihupi, Maxokapiu, Nova Canaã e Yawanapiwei no rio Demini e o xapono do Ayaris no Baixo rio Maia, afluente do rio Cauaburis.
A Formação dos professores indígenas tem como base legal, a Constituição Federal do Brasil de 1988, a Portaria Interministerial 559/91; o Decreto 1.904/96 que institui o Programa Nacional de Direitos Humanos; a Lei 9.394/96 Diretrizes e Bases da Educação Nacional; o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas (1998); o Parecer nº 14/09/99 Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Escolar Indígena normatizadas na Resolução N. 03/1999 do Conselho Nacional de Educação e da Câmara de Educação Básica; a Lei nº 10.172/01 do Plano Nacional de Educação; Diretrizes para organização da educação escolar indígena Resolução nº 05/2012(CEB/CNE); Referenciais para Formação de Professores Indígenas Parecer, Resolução Nº. 02/2015 (CEB/CNE) de Diretrizes Curriculares Nacionais para formação de professores Indígenas a Nível Médio e Licenciatura Intercultural, entre outros documentos.
Na esfera da Educação Escolar Indígena, a Constituição Federal assegura aos povos indígenas o uso de sua língua materna e dos processos próprios de aprendizagem. “O ensino fundamental regular será ministrado em língua Portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”, (2º parágrafo do Artigo 210, seção I – Da Educação).
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