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Organizações indígenas do Amazonas lança documento com histórico das violências contra indígenas

Exemplos das práticas de violações e extermínios utilizadas desde o projeto brasileiro de ocupação da Amazônia na década de 1960, estão descritos no documento da Famddi, Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas.


Lígia Apel, assessoria de comunicação Cimi Regional Norte I

Steffanie Schmidt, assessoria de comunicação da Secoya

*Produção em colaboração com a rede Famddi – Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas


No dia 14 de abril, findou o Acampamento Terra Livre, edição 2022, que reuniu mais de 7 mil lideranças indígenas, em Brasília. Foram 10 dias de intensas manifestações, incidências, mobilizações, caminhadas, danças e cantos que mostraram ao mundo a vida indígena brasileira.


Na semana que passou, em alusão ao Dia do Índio e à Semana dos Povos Indígenas, o país viveu em todo o seu território, centenas de manifestações e celebrações, estudos, debates e reflexões, mobilizações e incidências que colocaram os povos originários em evidência.


Incansáveis, os indígenas de todo o país não desistem de lutar pelo direito de continuar existindo. “Estamos aqui não é por acaso, não é porque queremos. Buscamos melhorias para a nossa população e para a proteção dos nossos territórios e das nossas vidas”, diz o tuxaua Cesar Wapichana, da região Serra da Lua, Terra Indígena Tabalascada, em Roraima.


Um dos resultados que as mobilizações têm alcançado, ao que tudo indica, é que o Grupo de Trabalho (GT) dos deputados federais que iria analisar o Projeto de Lei 191/2020, que autoriza a mineração em Terras Indígenas, bem como a exploração de petróleo e outros recursos naturais, aprovado em regime de urgência, ainda não foi formado. O prazo era 30 dias. Já se passaram mais de 40 e o presidente do Congresso Nacional, Arthur Lira (PP/AL), não consegue formar o GT, porque os líderes políticos não indicam seus representantes. Sem nomes indicados, não há GT e o PL fica na gaveta.


Mas, a luta indígena não está paralisada. Indígenas continuam em seus territórios se mobilizando, se articulando, promovendo encontros e debates, resistindo.


Também os parceiros indigenistas continuam contribuindo, apoiando e divulgando estudos, memórias e reflexões sobre a vida indígena brasileira e as históricas tentativas de exterminá-la.


Nessa perspectiva, a Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas (Famddi), coletivo de entidades indígenas e indigenistas do Amazonas, do qual o Conselho Indigenista Missionário Regional Norte I integra, lançou o documento “O PL nº 191/2020 e ação destruidora dos povos indígenas do Brasil”, contendo análise de conjuntura e retrospecto histórico das violações contra povos indígenas desde o projeto brasileiro de ocupação da Amazônia na década de 1960.


O documento traz exemplos de como essas práticas foram prejudiciais aos povos originários sem qualquer retorno de benefícios ou compensação para as comunidades, que também não foram consultadas à época, fato que vem sendo repetido na tentativa de aprovação do PL 191/2020, que autoriza a mineração em terras indígenas.


A análise lista as incongruências do contexto, como a tramitação do projeto em um ambiente político declaradamente anti-indígena e os interesses ocultos à proposta como a existência de mais de 3 mil requerimentos minerários sobrepostos a terras indígenas da Amazônia Legal registrados no sistema da Agência Nacional de Mineração (ANM).


Além disso, o texto reforça o argumento de inconstitucionalidade denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) apontado a violação do direito de consulta prévia expressa na Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário.


“A Constituição confere caráter de excepcionalidade a essa atividade econômica em terras indígenas e veta a exploração mineral garimpeira. O processo de tramitação do PL Nº 191/2020 fere de morte o fundamento constitucional e potencializa a geração da violência, da destruição e do caos nas terras indígenas”, aponta outro trecho.


Estudos revelam que a atividade de mineração está associada a conflitos, má distribuição de renda e geração de subempregos, segundo pesquisa realizada pela professora Heloísa Pinna Bernardo, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em 18 municípios de Minas Gerais com atividade minerária expressiva, entre os anos de 2009 a 2013. Nesse contexto, mesmo com suas compensações econômicas não tem efeito positivo sobre o índice de desenvolvimento humano (IDH) nos municípios onde acontece a exploração, aponta a pesquisadora.

A Famddi resgata ainda os prejuízos ambientais e risco de morte que a mineração traz a exemplo das tragédias ocorridas com o rompimento de barragens de rejeitos, em Brumadinho (2019) e em Mariana (2015), em Minas Gerais, classificados como os maiores desastres ambientais do Brasil.


No Amazonas, na década de 1980, o grupo Paranapanema iniciou a exploração de estanho na Mina de Pitinga, por meio da Mineração Taboca, no território indígena Waimiri-Atroari o que resultou no esbulho de 526.800 hectares da terra indígena, deixando a mineração fora dos limites da referida terra, arbitrariamente decretados. Em maio de 2021, o MPF/AM recomendou a suspensão imediata do depósito de resíduos ou lançamentos de qualquer tipo de substâncias em barragens de retenção do Complexo Mineral do Pitinga, de responsabilidade da empresa Mineração Taboca, que apresentou vazamento e contaminou um igarapé e dois rios localizados no interior da terra indígena Waimiri Atroari, em Presidente Figueiredo (AM).

No município de Autazes (AM), em território do povo Mura, há, nesse ano, novas investidas da empresa Potássio do Brasil, que se fortaleceu com a aprovação do regime de urgência do PL 191/2020, a pedido do Presidente da República que utilizou a guerra na Europa e a exploração de potássio brasileiro para a produção de fertilizantes para o agronegócio como argumentos.


Em março de 2017, diante das flagrantes violações aos direitos indígenas, a Justiça Federal suspendeu as atividades da mineradora, no âmbito de uma Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF, determinando que fosse realizada a consulta livre, prévia e informada ao povo Mura, como determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), tendo em vista que aproximadamente 32 aldeias e também as comunidades tradicionais da região sofrerão impactos sociais e ambientais. Devido a pandemia da Covid-19 a consulta foi paralisada e, agora, a luta pela consulta é retomada.


“Escolhas devem ser feitas e o Brasil, assim como outros países, necessitam fazer uso dos recursos naturais, inclusive oriundos da mineração, para suprir suas necessidades. O que precisa ser respeitado é o processo da escolha a ser feita pautada pela responsabilidade, o compromisso ético e a observância legal, legítima e necessária da Constituição Federal”, aponta o documento.


Sobre a Famddi


Criada em 14 de dezembro de 2018, durante o IV Encontro do Fórum de Educação Escolar Indígena do Amazonas (Foreeia), a FAMDDI reúne entidades indígenas e não indígenas voluntárias como Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Serviço de Cooperação com o Povo Yanomami (Secoya), Associação dos Docentes (ADUA), Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (SARES), Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime); Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (Amarn), Associação de Mulheres Indígenas Sateré-Mawé (Amism) e Fórum de Educação Escolar e Saúde Indígena do Amazonas (Foreeia).

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