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Servidores da Funai fazem ato nacional de greve

Funcionários reivindicam responsabilização de mandantes das mortes de Bruno Pereira e Dom Phillips e saída de presidente de órgão indigenista


Por Ester Cezar - Jornalista do ISA


Servidores da Funai fazem ato nacional de greve
Crédito: Ester Cezar / ISA

Reportagem atualizada em 24/6/2022, às 22:30


Servidores e servidoras da Fundação Nacional do Índio (Funai) participaram, nesta quinta (23), de um ato nacional de greve promovido pela organização Indigenistas Associados (INA) e a Associação Nacional de Servidores da Funai (Ansef), entre outras, para denunciar o desmonte do órgão oficial, exigir providências de sua direção e das autoridades para garantir a integridade dos funcionários e pedir a saída imediata do atual presidente, Marcelo Augusto Xavier. Protestos foram registrados em 38 cidades.


Uma mobilização nacional começou no dia 14 e, de lá para cá, foram sete dias de paralisação, cinco nesta semana. Entre segunda e quarta da semana que vem, está prevista mais uma vigília em frente à sede da Funai, em Brasília. Na quinta, está marcado mais um dia nacional de greve.


Os assassinatos do indigenista e servidor da Funai Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, desaparecidos no dia 5 e encontrados mortos no dia 15, em Atalaia do Norte, extremo oeste do Amazonas, foram o estopim do movimento. Eles sumiram na floresta após registrarem as atividades de invasores da Terra Indígena Vale do Javari, a segunda maior do país, com 8,5 milhões de hectares, na mesma região. Pereira foi cremado, na tarde desta quinta, em Recife. Phillips será cremado em Niterói (RJ), no próximo domingo.


Os dois foram achados após um dos suspeitos dos homicídios, Amarildo da Costa de Oliveira, levar as equipes de busca até o local do crime. Ele também implicou o irmão, Oseney da Costa de Oliveira. Há ainda mais dois suspeitos presos: Jeferson da Silva Lima, que teria atirado nas vítimas, e Gabriel Pereira Dantas. No total, a polícia investiga a participação de oito pessoas nos assassinatos.


As mortes acabaram expondo ainda mais o enfraquecimento do órgão indigenista promovido pelo governo Bolsonaro e a violência na Terra Indígena Vale do Javari.


Primeira greve em 10 anos


“Essa questão do Bruno levantou uma mobilização que há muitos anos não acontecia na Funai. Há 10 anos não se declarava greve na Funai. Então, a força do Bruno e do Dom levantou também uma série de questões que estavam dormentes, mas que também são mais que necessárias para que a gente fortaleça a política de povos isolados, a política [de povos] de recém-contato e a proteção das Terras Indígenas em geral”, diz Luiz Carlos Lages, servidor da Funai e membro da INA.


“É inevitável, nesse contexto, a gente não passar para a pauta que é o ‘Fora, Xavier!’, que é uma das nossas principais pautas aglutinadoras, justamente porque o Marcelo Xavier veio à Funai para cumprir a promessa feita pelo presidente Bolsonaro de dar uma foiçada no pescoço da Funai. Assim, na gestão dele, a proteção territorial das terras indígenas, não só do Javari, como do Brasil inteiro, sofreu bastante e tem sofrido uma série de ataques e revezes”, complementa.


Lages acrescenta que o movimento também condena a militarização do órgão indigenista, com a nomeação de integrantes das Forças Armadas e policiais sem qualificação ou experiência para cargos importantes.


Durante o ato em Brasília, a servidora e membra da INA Luana Almeida explicou que os funcionários foram ignorados por Xavier na tentativa de dialogar sobre as reivindicações. Depois disso, o movimento decidiu que não o considera mais um interlocutor válido. De acordo com a INA, o secretário-executivo adjunto do Ministério da Justiça, Washington Leonardo Guanaes Bonini, prometeu um encontro com o ministro Anderson Torres nos próximos dias.


“Hoje, o maior objetivo da greve é sermos recebidos pelo ministro da Justiça para poder apresentar as nossas reivindicações e para poder pactuar com pessoas que tenham de fato poder decisório, para tirar encaminhamentos relativos aos [nossos] oito pontos emergenciais, e também uma pauta estruturante para recomposição e reorientação da atuação da Funai em prol da sua missão institucional, que é proteger e defender os direitos dos povos indígenas”, afirmou.


Os oito itens mencionados por Almeida foram encaminhados a Torres, no dia 20, por meio de um ofício. Entre as demandas, estão o envio de forças de segurança para garantir a integridade física dos servidores em todas as bases de proteção do Vale do Javari; a continuidade das investigações dos assassinatos de Pereira e Phillips e a identificação dos mandantes; e a saída dos atuais membros da cúpula da Funai, incluindo os que ocupam cargos superiores (confira lista no quadro ao final da reportagem).


Omissão da Funai e do Estado


“O Vale do Javari diz que vai lutar até o último índio e afirmo: não sei quanto tempo estarei aqui, mas gostaria de ressaltar isso — nós estamos com vocês e vamos nos fortalecer porque certamente unidos nós vamos vencer e, mais ainda, vocês não estão sós. É por Dom e por Bruno!”, ressaltou o assessor jurídico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Eliésio Marubo, no ato em Brasília.


“Eles dois perderam a vida pela omissão do Estado, pela omissão da Funai, que teima em criminalizar a conduta de vocês servidores, que teima em criminalizar a atuação das nossas organizações, das nossas lideranças”, concluiu.


Além dos servidores da Funai, a mobilização desta quinta contou com o apoio de representantes dos povos indígenas que reforçaram a crítica ao desmonte do órgão indigenista e as reivindicações por condições dignas de trabalho para os servidores. Os indígenas fizeram rezas e prestaram homenagens a Pereira e Phillips.

O que estão reivindicando os servidores da Funai?


1) Declaração pública do presidente da Funai, retratando-se de suas declarações difamando Bruno Pereira e Dom Phillips.

2) Envio imediato de forças de segurança para garantir a integridade física dos servidores da Funai em todas as bases de proteção da Terra Indígena do Vale do Javari e coordenações regionais (CRs) da Funai na região.

3) Envio imediato de força-tarefa para apoio aos servidores e às atividades das CRs Alto Solimões e Vale do Javari, bem como da Frente de Proteção Etnoambiental do Vale do Javari.

4) Nenhuma retaliação aos servidores em greve, incluindo mudanças de lotação, exoneração de cargos e abertura de sindicâncias administrativas.

5) Pagamento dos dias parados aos grevistas sem compensação de horário.

6) Apuração até o fim das responsabilidades pelos assassinatos, ressaltando que a violência no Vale do Javari tem conexões com o crime organizado.

7) Que o Ministro da Justiça receba imediatamente uma comissão dos servidores para discutir as reivindicações.

8) Troca do comando da Funai, incluindo o presidente Marcelo Xavier e todos os membros anti-indigenistas da equipe de assessores e cargos de direção e assessoramento superior.


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